quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Noites em Lisboa

Atravessa a rua o mais clandestino dos sentimentos,

desliza em passadas comprometidas

com olhos rasgados de quem possui todas as observações,

vem pelo vendaval de silêncio que lhe sopra a calma

e esgueira-se pelas varandas e estendais,

contorna as nódoas de luz pelo chão.

Acende um cigarro,

corrompe as silvas de fumo

e estreita-se até ao próximo beco

cheio de histórias e garrafas secas.

Faltam vinte minutos para as quatro da madrugada

falta meio respirar para a noite ser mais noite

e cobrir a cidade de luzes frouxas,

as estatuas mais verdes bebem dos sonhos

que acabam de sair pela janela,

a poesia sai à rua,

vejo-a disfarçada de poça de água,

escondida nos arbustos a espera do orvalho matinal,

livre sobre o voou e o sono dos corvos

eu sei que ela lá está,

prova-se à distancia a textura granulada das palavras

e respira-se a paciência de todos os livros que foram escritos.

Troco olhares com esse sentimento nefasto, sadio.

Atravesso a rua em jeito néscio,

afasto os meus olhos para o chão,

subo a ladeira,

e apercebo-me de toda uma vida que perdi naquele instante.


Pedro Afonso

1 comentário:

Anónimo disse...

Nas Noites de Lisboa, o Poeta vagueia em busca do Sentido... Encontrado nos sentimentos que o inundam, procura a razão que o faça perceber, a vida existência que é o seu Simplesmente Ser.